De Veríssimo, no globo:
Um fenômeno novo na realidade brasileira é o ódio político, o
espírito golpista dos ricos contra os pobres. O pacto nacional popular
articulado pelo PT desmoronou no governo Dilma e a burguesia voltou a se
unificar. Economistas liberais recomeçaram a pregar abertura comercial
absoluta e a dizer que os empresários brasileiros são incompetentes e
superprotegidos, quando a verdade é que têm uma desvantagem competitiva
enorme. O país precisa de um novo pacto, reunindo empresários,
trabalhadores e setores da baixa classe média, contra os rentistas, o
setor financeiro e interesses estrangeiros. Surgiu um fenômeno nunca
visto antes no Brasil, um ódio coletivo da classe alta, dos ricos, a um
partido e a um presidente. Não é preocupação ou medo. É ódio. Decorre do
fato de se ter, pela primeira vez, um governo de centro-esquerda que se
conservou de esquerda, que fez compromissos, mas não se entregou.
Continuou defendendo os pobres contra os ricos. O governo revelou uma
preferência forte e clara pelos trabalhadores e pelos pobres. Não deu à
classe rica, aos rentistas. Nos dois últimos anos da Dilma, a luta de
classes voltou com força. Não por parte dos trabalhadores, mas por parte
da burguesia insatisfeita. Dilma chamou o Joaquim Levy por uma questão
de sobrevivência. Ela tinha perdido o apoio na sociedade, formada por
quem tem o poder. A divisão que ocorreu nos dois últimos anos foi
violenta. Quando os liberais e os ricos perderam a eleição não aceitaram
isso e, antidemocraticamente, continuaram de armas em punho. E de
repente, voltávamos ao udenismo e ao golpismo.
Nada do que está escrito no parágrafo anterior foi dito por um
petista renitente ou por um radical de esquerda. São trechos de uma
entrevista dada à “Folha de São Paulo” pelo economista Luiz Carlos
Bresser Pereira, que, a não ser que tenha levado uma vida secreta todos
estes anos, não é exatamente um carbonário. Para quem não se lembra,
Bresser Pereira foi ministro do Sarney e do Fernando Henrique. A
entrevista à “Folha” foi dada por ocasião do lançamento do seu novo
livro “A construção politica do Brasil” e suas opiniões, mesmo partindo
de um tucano, não chegam a surpreender: ele foi sempre um
desenvolvimentista nacionalista neokeynesiano. Mas confesso que até eu,
que, como o Antônio Prata, sou meio intelectual, meio de esquerda, me
senti, lendo o que ele disse sobre a luta de classes mal abafada que se
trava no Brasil e o ódio ao PT que impele o golpismo, um pouco como se
visse meu avô dançando seminu no meio do salão — um misto de choque
(“Olha o velhinho!”) e de terna admiração. Às vezes, as melhores
definições de onde nós estamos e do que está nos acontecendo vem de onde
menos se espera.
Outro trecho da entrevista: “Os brasileiros se revelam incapazes de
formular uma visão de desenvolvimento crítica do imperialismo, crítica
do processo de entrega de boa parte do nosso excedente a estrangeiros.
Tudo vai para o consumo. É o paraíso da não nação.”
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