Senhor Bom Jesus do Bonfim é um título dado pelos cristãos a Jesus crucificado. Juntamente com o título de Bom Pastor (cf. Jo 10,11), sintetiza, a meu ver, toda ação de liderança do Mestre na sua comunidade.
Para os judeus, os reis e as lideranças religiosas tinham o compromisso de pastorear o povo, promovendo-lhe justiça, vida digna e prosperidade de acordo com a vontade de Javé. Se Jesus era o Bom Pastor, as lideranças religiosas e políticas de sua época encarnavam o mau pastor, preocupadas em pastorear a si mesmas, o que levava o povo a viver numa situação de penúria, escravidão e exploração. Jesus os chamava de mercenários, que existiam só para roubar, matar e destruir (cf. Jo 10, 7-13). O Filho de Maria, no entanto, representava a liderança autêntica, que dava a vida pelo bem-estar do povo.
Ao se colocar ao lado dos marginalizados e explorados pelo sistema político e religioso, Jesus encontrará forte resistência e verá suas ações interpretadas como insurreição contra o estado e contra o judaísmo. Por isso, "os fariseus saíram imediatamente e deliberaram com os herodianos como acabar com ele", denuncia o escritor de Marcos (Mc 3,6). E o condenaram à morte de cruz, destinada aos escravos, baderneiros e contestadores do poder do Império Romano. Mas não se rende, segue com seu sonho de implantar uma revolução na sociedade, o Reino de Deus, e ama até o fim (cf. Jo 13,1).
Essas dimensões presentes no título Senhor Bom Jesus do Bonfim devem nos levar a uma fé crítica, que analisa a sociedade em que vivemos de acordo com os princípios pregados e vivenciados por Jesus, Senhor do Bonfim. Ainda hoje podemos ver que muitas lideranças políticas estão comprometidas com seus próprios interesses em detrimento de uma vida digna para o povo. Recursos financeiros são desviados da saúde, educação e segurança, impondo à população mais vulnerável socialmente um serviço de péssima qualidade, muitos morrendo em decorrência disso. Por outro lado, os sistemas das mais variadas matizes religiosas continuam explorando, extorquindo e alienando seus seguidores.
Nesse contexto, celebrar o Senhor do Bonfim não significa apenas ficar numa devoção puramente subjetiva e romântica, mas utilizá-la para desenvolver uma consciência crítica da realidade, combatendo os maus pastores - lideranças políticas e religiosas -, defendendo os marginalizados e ajudando-os a ter uma vida digna e humana, bem como denunciar os preconceitos religiosos, raciais, de gênero e sexuais. Talvez assim valha a pena celebrar nosso Senhor do Bonfim.
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